sexta-feira, 5 de julho de 2024
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Porte de maconha: STF já tem maioria para diferenciar usuário de traficante, mas ainda há pontos a definir; entenda

Análise foi interrompida após o ministro Dias Toffoli pedir vista

O Supremo Tribunal Federal (STF) encerrou a sessão ontem com cinco votos a favor e três contra a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Já existe maioria em plenário pela definição de um parâmetro que diferencie usuários de traficantes, mas ainda está em discussão a quantidade específica e se esta decisão deve partir da Corte ou do Congresso. A análise foi interrompida após o ministro Dias Toffoli pedir vista.

Uma lei aprovada no Parlamento em 2006 já estabeleceu que usuários de drogas não sejam presos, mas deixou em aberto qual seria o critério objetivo para distingui-los de traficantes. Como já não há determinação de prisão, os cinco ministros votaram para declarar inconstitucional um trecho da legislação que prevê “prestação de serviços à comunidade” para quem, com relação à maconha, “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal”.

No caso da “prestação de serviços para a comunidade”, o debate gira em torno dos efeitos desta punição para quem é pego portando determinada quantidade de droga. Por isso, a avaliação dos cinco ministros que já votaram para descriminalizar o porte de maconha para consumo pessoal, é a de que a retirada desta pena é importante, uma vez que ela implica em uma restrição de liberdade e traz uma consequência mais grave.

Como votou cada ministro — Foto: Editoria de arte
Como votou cada ministro — Foto: Editoria de arte

— Está em discussão se, após a despenalização aprovada pelo Congresso, significando que não tem pena de prisão, o porte de maconha para uso pessoal deve ser tratado como crime ou como um ilícito a ser desestimulado com sanções administrativas — explicou Barroso, ressaltando que o julgamento não trata de legalização. — As drogas não estão sendo nem serão liberadas por decisão do STF.

Prisões lotadas

Restariam como sanções administrativas previstas na lei a “advertência sobre os efeitos das drogas” e uma “medida educativa de comparecimento a programa ou curso”.

Também votaram ao lado de Barroso os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e a ministra aposentada Rosa Weber — ela se manifestou antes de deixar a Corte, motivo pelo qual Flávio Dino está fora deste julgamento. Já Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques votaram contra, enquanto Toffoli, Luiz Fux e Cármen Lúcia ainda não se posicionaram.

Dos cinco que votaram a favor, apenas Fachin não defendeu a fixação de 60 gramas ou seis plantas fêmeas como patamar para diferenciar usuários de traficantes — para ele, a decisão cabe ao Congresso. Mesmo ministros que votaram contra defenderam que sejam estabelecidas quantidades para distinguir o enquadramento: Zanin e Nunes Marques são favoráveis a 25 gramas, enquanto Mendonça é a favor de o Congresso definir e de uma quantidade provisória de dez gramas enquanto isso não aconteça.

As frents sobre o tema — Foto: Editoria de arte
As frents sobre o tema — Foto: Editoria de arte

Um dos pontos que motivam o julgamento no STF é a superlotação dos presídios. Dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais, órgão do Ministério da Justiça, mostram que 28% da população carcerária no país está presa por crimes previstos na Lei de Drogas. Há hoje 644 mil presos no país, segundo os dados mais recentes. Existe também a avaliação de ministros de que pessoas pobres são presas com pequenas quantidades, tratamento distinto ao direcionado aos ricos. O ponto de partida da ação é a condenação de um homem preso pego com três gramas de maconha na cela.

O julgamento começou em 2015 e havia sido interrompido pela terceira vez no ano passado, por um pedido de vista de Mendonça. Ele citou impactos da maconha na saúde para se posicionar de forma contrária à descriminalização:

— São danos sérios à saúde, como aumento de suicídio e de acidentes.

Senado responde

Em seguida, Nunes Marques acompanhou o colega e defendeu que uma alteração nesse sentido caberia apenas ao Congresso. O próximo na ordem de votação seria Fux, mas Toffoli anunciou que pediria vista e o julgamento foi interrompido. Desta forma, ele terá até 90 dias para devolver o caso para julgamento, mas uma nova data para a análise ser retomada só será definida por determinação de Barroso.

Interlocutores de Toffoli afirmam que o ministro avalia que não é o momento de debater o tema, que na visão dele tem potencial de desgastar a relação com o Legislativo e deveria ser enfrentado pelo Congresso. Ainda no ano passado, como uma reação ao julgamento da ação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que torna mais rígido o entendimento em vigor e considera crime a posse e o porte de drogas independentemente da quantidade. Ontem, Pacheco voltou a defender a tramitação do texto, ponderando que “respeita” o julgamento da Corte. Uma reunião hoje deve definir um cronograma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Como consequência do amplo impacto do julgamento, houve também um embate entre Mendonça, Moraes e Barroso a respeito do conceito de descriminalização.

— O Congresso já despenalizou o usuário de droga, porque ele não é privado da liberdade. Estamos tratando de duas questões: necessidade de critério para distinguir tráfico de uso e a descriminalização — afirmou Mendonça.

Barroso argumentou que os ministros que acompanharam Gilmar Mendes, o relator, entenderam que ao usuário seria aplicada sanção administrativa, mas não criminal:

— Para um jovem pobre que está procurando emprego, se constar da certidão de antecedentes que ele não é mais primário, é uma dificuldade a mais em uma vida já difícil.

Moraes, ao entrar no debate, disse concordar com Mendonça ao dizer que é descriminalização:

— Mas isso não quer dizer que a pessoa vai poder fumar maconha no cinema.

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