sexta-feira, 17 de maio de 2024

Empresa americana teria ligação com contrabando de ouro ilegal da Amazônia

Quem fica com o ouro apreendido??

Uma apreensão de R$ 10 milhões mostrou que negócio ilegal é praticado há décadas.

Uma reportagem do Reporter Brasil e da NBC News informou neste sábado, 1º, que uma apreensão de R$ 10 milhões em barras de ouro no aeroporto de Manaus expõe a falta de fiscalização, que atrai estrangeiros em busca de contrabando ilegal na Amazônia.

A reportagem relata que em janeiro de 2020, dois americanos e um brasileiro foram abordados por agentes da Polícia Federal (PF). Os policiais estavam interessados na mala rosa com a qual eles pretendiam embarcar para Nova York, carregada com 35 kg de ouro amazônico que hoje valem R$ 10 milhões.

Durante a abordagem, os três informaram que a carga seria de reaproveitamento de joias derretidas, mas a PF já tinha informações de inteligência sobre a possível origem irregular.

A primeira análise da composição do material, feita ainda no aeroporto com uma pistola de raio-X, apontou a origem ilegal, como foi depois confirmado por outras duas perícias mais precisas. A análise detectou impurezas “frequentemente encontradas em ouro de garimpo e nunca em material reciclado”.

Segundo os laudos, o ouro seria da Província Aurífera do Tapajós, no Pará, onde estão três das terras indígenas mais afetadas pela mineração ilegal: Munduruku, Sawré-Muybu e Sai-Cinza, segundo o Mapbiomas.

A Empresa

Bellino, 65, e Giannuzzi, 43, eram amigos há mais de uma década quando foram apresentados a Nascimento em 2019 pela esposa de Giannuzzi, que é brasileira. Foi daí que surgiu a ideia de importar ouro da América do Sul para EUA e Turquia. Os estrangeiros então criaram a empresa Doromet, que promete “serviço completo” no comércio de metais preciosos e tem sede em Manhattan.

A Bamc Laboratório de Análises de Solos e Minérios Ltda, criada em 2018 como um comércio atacadista de minérios, aumentou em 65 vezes a compra anual de ouro entre 2019 e 2022, passando de 35 kg para 2.279 kg. A empresa, porém, não está autorizada a comprar ouro de garimpo no Brasil, segundo a ANM (Agência Nacional de Mineração).

Em 2021, Bellino entrou com uma ação na Justiça de Nova York contra o antigo sócio e o brasileiro, alegando ter investido US$ 750 mil na Doromet, mas não ter recebido participação pelo “negócio lucrativo” que a firma havia se tornado.

Esse processo confirma que, após a apreensão em Manaus, “todas as remessas de ouro subsequentes foram recebidas do Brasil e processadas nos Estados Unidos, além de em Istambul, Turquia”.

Esquema

Em Nova York, o metal brasileiro seria refinado a poucas quadras da Doromet, na Gold Tower Refinery, que teria assinado um termo de compra com Ginanuzzi e Bellino. Porém, a refinaria disse que o documento apresentado à Justiça é “forjado” e que a empresa “jamais assinou qualquer acordo” envolvendo ouro brasileiro.

No mesmo mês em que conheceu os americanos, Nascimento assinou um contrato com Werner Rydl, bilionário austríaco naturalizado brasileiro que se comprometeu a fornecer mensalmente ao goiano até 700 kg de ouro de reaproveitamento de joias. A quantia equivale a mais de 200 mil alianças de casamento por mês —número superior a todos os brasileiros divorciados em 2022.

Rydl já foi flagrado tentando embarcar com ouro de origem duvidosa em 2015, no aeroporto de Cuiabá, e em 2018 em Guarulhos. Além disso, é investigado pela PF por exportação de 120 toneladas do metal em situação suspeita.

Sobre a pureza das barras apreendidas não serem compatíveis com joias derretidas, Rydl afirmou: “Bobagem, joias existem em qualquer pureza”.

A indicação da origem ilegal dos 35 kg de ouro na primeira perícia da PF não demoveu os americanos de brigar na Justiça brasileira pela carga. Tampouco convenceu alguns magistrados da necessidade de mantê-la no Brasil, já que dois juízes votaram pela devolução do minério.

Quem fica com o ouro?

O MPF defendeu no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1a Região) que o ouro ficasse sob a guarda da União, pois seria “extremamente difícil ou até mesmo inviável” recuperá-lo se fosse levado ao exterior.

Mesmo assim, o relator do processo, Ney Bello, aceitou a tese da Doromet de que o primeiro laudo da PF era “precário” e de que a propriedade do minério e sua origem legal estavam “documentalmente provadas”. Bello foi cotado por Bolsonaro para assumir uma vaga no STJ em 2022.

Seu voto foi acompanhado pela presidente da turma, Maria do Carmo Cardoso, amiga do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) que teve as redes sociais bloqueadas após postagem a favor de atos golpistas.

O TRF-1 afirmou que a decisão referiu-se apenas à guarda do ouro, e que “questões acerca de posse, propriedade e origem não dizem respeito ao juízo criminal”. Bello e Cardoso foram procurados por meio do tribunal e não se manifestaram.

Com os votos de Cardoso e Bello, o caminho estaria livre para o metal seguir para os EUA, não fosse um auto de apreensão do ouro expedido em 2021 pela ANM.

O advogado Guilherme Peixoto de Almeida, que defende a Doromet no Brasil, afirmou que a apreensão da ANM é ilegal pois não foi precedida pelo devido processo legal.

Apesar de o minério ainda estar em disputa, a ANM disse que tem amparo legal para levar o ouro a leilão antes do fim dos processos, e que deve fazê-lo este ano. Enquanto isso, as barras seguem guardadas em um cofre da Caixa Econômica Federal em Manaus.

Naquela sexta de 2020, Giannuzzi e Bellino prestaram depoimento e, como não foram indiciados, puderam retornar aos EUA. Já Nascimento foi preso e pagou R$ 104 mil para sair da cadeia três dias depois.

A movimentação de sua empresa indica que ele pode ter descumprido a promessa de não voltar a se envolver com o comércio de ouro, assumida perante a Justiça para que houvesse o relaxamento da prisão preventiva.

*Com informações menezesvirtualeye

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