Em uma vitória marcante para famílias que enfrentam há quase uma década as consequências da epidemia de Zika vírus, o Congresso Nacional derrubou nesta terça-feira (17) o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à proposta que cria uma pensão vitalícia para crianças que nasceram com malformações associadas à infecção. A decisão foi tomada em sessão conjunta da Câmara e do Senado e restabelece integralmente o projeto aprovado pelos parlamentares em 2024.
Com a medida, o governo federal será obrigado a pagar mensalmente o valor equivalente ao teto do INSS — hoje em torno de R$ 8,1 mil — a pessoas com deficiência permanente causada pela síndrome congênita do Zika. O texto também prevê o pagamento de uma indenização única de R$ 50 mil por danos morais às famílias afetadas.
“Essa pensão não é favor, é justiça. Vai garantir tratamentos, alimentação especial, remédios, terapias, equipamentos e tudo o que essas crianças precisam todos os dias. Sem ela, o peso recai inteiramente sobre mães e pais que já carregam uma luta sem trégua há dez anos”, afirmou o senador Romário (PL-RJ), um dos principais defensores da proposta.
Microcefalia e o colapso do sistema de saúde
Entre 2015 e 2017, o Brasil enfrentou uma crise sanitária sem precedentes causada pelo surto de Zika. Transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o vírus provocou milhares de casos de microcefalia — condição neurológica grave que afeta o desenvolvimento do cérebro. Segundo o Ministério da Saúde, 4.595 bebês nasceram com a síndrome nesse período, a maioria no Nordeste.
Desde então, famílias convivem com a dura realidade de terapias caras, medicações específicas e fórmulas alimentares que ultrapassam o orçamento mensal. “Uma única lata da fórmula alimentar custa R$ 200. São 20 por mês. Sem esse apoio, essas crianças ficam sem o mínimo para sobreviver com dignidade”, alertou Romário durante a sessão.
Medida havia sido vetada por Lula
O presidente Lula havia vetado integralmente o projeto, alegando ausência de previsão orçamentária e o risco de criação de despesa obrigatória contínua. Em resposta, o governo propôs uma alternativa: o pagamento único de R$ 60 mil por meio de medida provisória, destinada a crianças de até 10 anos com sequelas da Zika. A proposta, no entanto, foi mal recebida por parlamentares e perdeu validade neste mês.
Apesar da rejeição ao veto representar um recuo para o Planalto, a decisão foi negociada com o governo. Segundo apuração, a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, participou de uma reunião no dia anterior com líderes partidários para articular a derrubada do veto e evitar um confronto direto com o Congresso.
Impacto fiscal e alcance social
A pensão será custeada pela União, sob a rubrica de “Indenizações e Pensões Especiais de Responsabilidade da União”. De acordo com estimativas da União Nacional das Famílias Vítimas da Zika (Unizika), 1.589 pessoas devem receber o benefício, com impacto fiscal anual de aproximadamente R$ 154 milhões.
Requisitos e regras do novo benefício
Para ter acesso à pensão, será necessário apresentar laudos médicos que comprovem a deficiência permanente associada ao Zika. O processo deverá ser regulamentado pela Previdência Social, que também será responsável pela análise dos documentos por meio de junta médica.
Outros pontos importantes da nova lei incluem:
Isenção de Imposto de Renda sobre a pensão;
Pagamento de 13º salário;
Acúmulo com o BPC (Benefício de Prestação Continuada), desde que o valor total não ultrapasse um salário mínimo;
Prorrogação da licença-maternidade por mais 60 dias para mães de crianças com microcefalia;
Fim da revisão periódica do BPC para vítimas da Zika.
Justiça após anos de omissão
A derrubada do veto representa, na avaliação de parlamentares e famílias, uma forma de reparação diante da omissão histórica do Estado no enfrentamento da crise da Zika. Durante anos, mães — em sua maioria pobres, negras e nordestinas — denunciaram o abandono e a precariedade no atendimento de saúde, educação e assistência social.
Agora, com a nova lei prestes a ser promulgada pelo Congresso, essas famílias finalmente vislumbram um alívio. “Não é caridade. É o mínimo diante de uma tragédia que poderia ter sido evitada com responsabilidade e ação do poder público”, disse uma das mães presentes à sessão, emocionada com o resultado.
A expectativa é que o benefício comece a ser pago ainda neste ano, após os trâmites de regulamentação pelo Executivo.
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